segunda-feira, 16 de novembro de 2009

A hipocrisia sincera da sociedade

“A sinceridade é um defeito incompatível com a vida em sociedade que deve ser eliminado, ou pelo menos controlado, pela nossa Inteligência Emocional.”


Imagine o estrago que causaria em nossa reputação simplesmente dizer que não queremos ir a determinado evento. É fundamental pensar em alguma desculpa, por mais esfarrapada que seja para não ser desagradável. Se não procedermos assim, na melhor das hipóteses as pessoas passariam a pensar duas vezes antes de nos convidar para qualquer coisa, apenas para evitar o desconforto de ouvir novamente que alguém não quer ir naquela festa "super-legal". Nunca é agradável ser confrontado com a idéia de que alguém despreza algo que valorizamos, no caso a tal festa.

Neste contexto, a sinceridade se torna absolutamente incompatível com qualquer tipo de relacionamento afetivo. (Considerando que todo tipo de relação, ou interação humana, é um relacionamento.)

Uma pessoa é sincera quando “se exprime sem artifício nem intenção de enganar ou de disfarçar o seu pensamento ou sentimento” (Dicionário Houaiss).

Imagine como se tornaria insustentável qualquer relacionamento se jamais disfarçássemos nossos pensamentos ou sentimentos? Dizer que a nossa beldade está acima do peso, que a roupa que nossa irmã escolheu para sair é ridícula, que a namorada do nosso amigo é uma vadia, que o nosso colega do trabalho é um semi-analfabeto ignorante, e que não suportamos olhar para a cara daquele vizinho que sempre nos dá “bom dia”.

Para viver em sociedade é preciso dissimular e ocultar cada um dos sentimentos e pensamentos que possam vir a ser inconvenientes. A sinceridade é tida comumente como uma qualidade apreciada nas pessoas, mas é uma grande mentira. É a falsidade a qualidade indispensável nas pessoas. A sinceridade é um defeito incompatível com a vida em sociedade que deve ser eliminado, ou pelo menos controlado, pela nossa Inteligência Emocional.

IE é aquela habilidade que faz com que você seja aquela pessoa super-agradável, super-feliz, que está sempre de bem com a vida, que gosta de todo mundo, que nunca reclama de nada e não tem senso crítico. Uma habilidade nata em todas as pessoas falsas, e extremamente útil para a vida em sociedade.

Alguém poderia perguntar: “Mas as pessoas falsas não são desprezadas e tem um baixo status social?”

Sim e não, pequeno gafanhoto. A falsidade é a qualidade mais valiosa para a vida em sociedade, desde que ela não seja percebida como tal. O hipócrita nunca pode ser descoberto em sua essência. A falsidade deve sempre simular sinceridade. Se a falsidade for descoberta, a máscara da persona criada cai, e a capacidade de sociabilização será drasticamente reduzida. Afinal, pessoas falsas não são de confiança…

A forma de equilibrar essa equação é fazer com que pessoas acreditem em sua falsidade.

Mentiras sinceras me interessam, me interessam…

Você precisa ser falso a ponto de fazer com que todos acreditem que você é sincero, maximizando assim todas as qualidades que você não tem, mas finge ter, e ocultando todos os seus defeitos, se tornando assim aquele cara super-gente-boa que todo mundo gosta.

Costumo dizer que as qualidades das pessoas são irrelevantes. Toda qualidade é obviamente uma coisa boa e desejável, senão não seria uma qualidade… Claro que conhecer as qualidades também é importante caso elas sejam ocultas ou não tão aparentes, mas o fundamental a se conhecer nas pessoas são os seus defeitos. Só podemos dizer que gostamos realmente de uma pessoa quando a conhecemos a ponto de saber quais são os seus defeitos.

Somente quando conhecemos os defeitos de uma pessoa temos a oportunidade de considerá-la na completude do seu ser, podendo assim emitir uma opinião favorável ou não a respeito dela.


Longe de fazer um juízo moral sobre a conduta existencial de cada um, o que mais vale aqui pensar os modelos que a sociedade nos obriga a seguir e a conveniência de aderir ou não a eles. É preciso pensar no tipo de relacionamento que pretendemos estabelecer com as outras pessoas.

Ele vai ser baseado na agradável hipocrisia das aparências, ou na muitas vezes desagradável sinceridade da nossa essência?


Façam suas escolhas.